Monday, May 21, 2007

Descontos de Tempo

Vou «matar» aqui o jogo, com um pedido de desculpa a todos por tamanhas barbaridades que aqui ficaram gravadas. Não vou justificar tudo o que escrevi com álcool e drogas, nem mesmo com pura demência. Acho mesmo que não há justificação plausível para este pequeno compêndio de textos absurdos.
No entanto, queria daqui enviar um abraço ao Miguel Bruno e ao Jaime Alves, dois valores do nosso futebol que não couberam nesta obra épica. Isto serve apenas para lembrar o famoso “efeito iceberg”: só se vê os 10% que estão à superfície. Este efeito aplica-se a este livro e à relação do mesmo com o futebol nacional: apresentei aqui um número muito restrito de jogadores, que ficou ainda mais limitado pelo facto de se referir apenas aos anos 90. No entanto, muitos mais artistas pisaram os nossos relvados. A esses, peço desculpa pelo meu lapso amnésico. Aos adeptos que se regozijavam com as incursões de Darci na extrema esquerda do estádio do Restelo, peço também desculpa. Quem diz um Darci, diz e relembra com saudade tantos outros jogadores que não tiveram aqui a devida homenagem.
Para rematar, quero apenas relembrar a dupla de jogadores leste europeus que foram contratados com o intuito de dar novo sangue a um Belenenses há muito arredado dos tempos áureos: Zoran Ban, internacional croata que chegou emprestado pela Juventus, e Dariusz Adamczuk, médio internacional polaco proveniente da Udinese. Nenhum deles fez história no clube da cruz de Cristo, e a moral da história é que o melhor bife é o à casa!

Obrigado.


O FIM.



P.S.: Quero pedir desculpa aos leitores que deram por eles a vegetar, com baba a cair dum canto da boca, por não terem lido nada de inteligente neste livro. Mas sejamos sinceros… se estavam à procura de algo inteligente tinham ido ler um manual de economia, com brilhantes conclusões na linha de quantos mais chouriços tiver para vender, menor é o preço que irá cobrar por cada um. Isto não se aplica aos plantéis futebolísticos, mas meramente a bens homogéneos. Quem dera ao Benfica ter vendido os extremos esquerdos Washington Rodriguez e Leónidas (jogadores da época de Damásio) a um preço médio tendo em consideração todo o plantel. O facto de ter apenas um jogador não quer dizer que se o clube o vender irá ficar milionário. Enfim, podia continuar com hipóteses mas nunca mais sairíamos daqui.
Por fim, no início do livro apelidei a década de 90 como “mágica”. Isto porquê? Porque foi a década em que eu começei a reparar no futebol, foi a altura em que tinha idade para coleccionar as cadernetas de cromos do campeonato nacional. E guardei-as. E hoje em dia dá-me um enorme gozo abrir as mesmas, olhar para os jogadores e para os respectivos comentários ridículos genéricos, como “transferiu-se esta época para o clube. Tem potencialidades para se afirmar no campeonato português”, e pensar: “epá, lembro-me tão bem deste marreta!”. São comentários feitos para crianças de catorze anos, e seguramente que na altura ficava entusiasmadíssimo quando apelidavam o avançado Pitico de rápido e regular.
Pessoalmente, delicio-me ao recordar, nostalgicamente, alguns jogadores caricatos que passaram pelo nosso campeonato. Generalizei, talvez erradamente, este pensameto e, neste momento, é muito possível que o leitor esteja de pé a aplaudir com eterno júbilo por este livro ter, finalmente, terminado.

O VERDADEIRO FIM.

As Maiores Tristezas do Futebol

Nem só de alegrias vive o futebol. Há drama no dia-a-dia do desporto rei, tal qual a vida da qual é parte integrante.
Muita gente pode achar que as tristezas se restringem à perna do Jokanovic a apontar para o Sado enquanto que o pé apontava para o Douro. Outros dirão que triste, triste, é o cabelo do Paixão. Ainda há um ou outro que chorou quando Sérgio Cruz abandonou o futebol ou quando Mandla Zwane deixou os relvados nacionais.
Para mim a maior tristeza inerente ao futebol é a incapacidade de sobrepor gerações. Nunca ninguém saberá qual era realmente o melhor jogador do mundo, dado que não jogaram todos na mesma época, enfrentando o mesmo tipo de futebol. Nomes como Pélé, Maradona, Latapy ou mesmo Zidane ficarão para sempre rotulados de mágicos, de predestinados, mas nunca haverá uma aproximação aceitável a um consenso sobre qual seria realmente o melhor.

Passando estes deliciosos mas impossíveis confrontos para o panorama nacional, há um confronto que muitas pessoas estariam em pulgas para assistir, qual Tyson vs. Lewis, ou melhor dizendo, David vs. Golias.
Trata-se, obviamente, do choque de titãs a meio campo que nos proporcionaria um Porto de meados dos anos 90 com um Benfica mais actual. De azul e branco equipava um mago cuja dimensão não traduzia o talento futebolístico. Falo do desproporcional Rui Barros. Igualmente desproporcional no rácio tamanho/talento, mas para o extremo oposto, está o antigo trinco que equipou de águia ao peito, Fernando Aguiar.


Com um mero exercício imaginário, vislumbro o ex-monegasco, de bola dominada junto ao pé direito, a passar por debaixo das pernas do internacional canadiano e, perdoem-me o sentimentalismo, mas não consigo conter a lágrima. Seria um confronto que, se tivesse acontecido, certamente daria origem a diversas obras literárias de qualidade acima da estatura do sucessor de Platini na Vecchia Signora.

Claramente que Rui nem sempre poderia levar a melhor. Estatisticamente, mais tarde ou mais cedo Aguiar tinha de ganhar algum despique. Ou então aconteceria o acidente mais que provável: no meio do jogo rui desaparecia. Jogadores e árbitros entram numa busca incessante pelo jogador, que é finalmente encontrado colado à sola de Aguiar, que o havia pisado involuntariamente. A pata de Fernando Aguiar provavelmente será do tamanho de um kart, que é o veículo de transporte mais ajustado à dimensão de Rui Barros.

Qualquer outro confronto que eu destacasse aqui seria invariavelmente reduzido a pó perante a imponência do Barros vs. Aguiar, por isso achei melhor terminar por aqui esta secção, sem no entanto imaginar o trinco, no final da partida e depois de sofrer muitas reviengas e rodriguinhos no relvado, a engolir o fantasista em pleno túnel de acesso aos balneários, sem sequer mastigar. Chegando ao balneário da equipa, solta um valente arroto cujo odor é prontamente contestado pelo eternamente suadinho mister Camacho: “mas que pivete é este a Rui Barros, Aguiar???”. É tudo uma questão de escala.

A triste sina de ser Guarda-Redes: Top 10

Top 10 dos Guarda-Redes da década de 90:

Este top é tão oficial quanto a feira da ladra. No entanto, não quer dizer que não exista ou não seja útil, logo vamos a isso. Apreciem a contagem decrescente, do 10 até ao 1, passando por outros 8 jogadores no meio.

Para eleger estes 10 mitos das redes, usámos uma fórmula econométrica muitíssimo complicada e recorremos a uma base de dados vastíssima com estatísticas completíssimas que iam desde saídas por jogo a número de pitons na chuteira.
Acabámos por achar um rácio que eficazmente traduz a qualidade do guarda-redes e que também é de fácil compreensão para o comum adepto que não gosta de tratamento e análise de dados.


Rácio de Qualidade do Guarda-redes:

Defesas da tarde / jogos na 1ª divisão



Os “jogos na 1ª divisão” penso que se explicam sozinhos. As “defesas da tarde” é um conceito algo vago e incerto, principalmente porque depende da opinião dos comentadores e observadores da partida. Logo, qual a defesa da tarde poderá ser discutível. Aliás, muitas vezes há uma grande defesa logo ao minuto 2, mas o comentador não quer cair no potencial erro de lhe chamar defesa da tarde, pois a probabilidade de haver uma defesa melhor nos restantes 88 minutos é elevadíssima. Assim sendo, uma defesa tem maior possibilidade de ser a da tarde, quando mais adiantado estiver o jogo. No entanto, a partir do minuto 80 o comentador começa a ficar apertado de tempo para eleger a defesa da tarde, e pode-se precipitar e eleger como a melhor defesa do jogo uma estirada perfeitamente vulgar (para evitar o crime de deixar a partida terminar sem eleger a defesa da tarde).

São erros do ofício com os quais temos que viver, logo vamos proceder à apresentação do top 10:


10) Acácio

O aborígene, como era carinhosamente tratado pelas gentes de Aveiro, esteve presente no mundial de 90, em Itália, onde foi suplente de Taffarel. Símbolo do Vasco da Gama, veio acabar a carreira em Portugal, ingressando no Tirsense e depois no Beira Mar, onde ganhou maior fama.
Com 94kg, rebolava rumo à bola como poucos. Formou um tridente medonho (para os adversários, como é óbvio), com Dinis e Eliseu, a dupla de centrais da equipa de Aveiro, insuficiente para manter o clube no principal divisão nacional, apesar de ter acabado a época como treinador-jogador. A principal razão para a despromoção prendeu-se provavelmente com as atrofiadas exibições fora de portas, onde lograram apenas uma vitória e um empate.
Fica, no entanto, o registo de mais um mundialista a pisar o relvado do Mário Duarte, anos depois do perfume do futebol internacional ter pairado no ar aveirense através da irreverência egípcia de Abdel Ghany


9) Neno

Adelino Augusto ou simplesmente Neno, como era conhecido nas lides do futebol, era um guarda redes felino e de reflexos fabulosos, característica marcante nos atletas africanos.
Um magnata na arte de sair mal dos postes, compensava com uma presença imponente entre os dois mastros.
Também conhecido como o Júlio Iglésias português, este cabo verdiano de cabelo encaracolado, solto e oleoso discutiu durante épocas a fio a titularidade na baliza do Benfica com Silvino.
No final, saiu vencedor, pois nas quatro épocas em que ambos equiparam de águia ao peito, Adelino jogou 94 partidas, contra as 47 do seu amigo e rival (que no entanto vestiu a camisola do Benfica por 184 ocasiões).
Neno deixou saudades, um álbum musical, e toda a boa disposição de quem tornava imprevisível qualquer directo televisivo a partir dos balneários.


8) Best

Por vezes, deitado na minha cama, começo a pensar em todas as injustiças do mundo, e há uma que tanto tem de recorrente quanto de revoltante. Porquê? Porque será que Best sempre foi o suplente crónico por todos os clubes por onde passou na 1ª divisão?
A sua alcunha certamente que não lhe foi dada aleatoriamente. Tratou-se de um intenso e completíssimo estudo sobre guarda-redes feito por cientistas e analistas britânicos. Chegaram à conclusão que Artur Paulo da Silva era o Best, que muito justamente tomou essa deixa e elegeu novo cognome futebolístico.
Muitas pessoas não familiarizadas com a língua inglesa podem julgar que Best é simplesmente uma abreviatura de Bestial. Nada mais falso e injusto para com o jogador em questão. Best traduz-se para português como Melhor!
Assim sendo, e partindo do princípio que o treinador do Leça, mister Festas, fala inglês, vamos fazer um pequeno exercício mental de lógica futebolística.
Olhando para a folha de jogadores disponíveis, o mister tem à sua disposição um Best e um Vladan… qual deverá escolher? Um treinador racional escolheria a melhor opção. No entanto, o treinador nacional não é necessariamente racional, e muitas vezes maior é sinónimo de melhor. Ora Vladan apresentava-se aos sócios do alto do seu metro e noventa e sete. A fatalidade para Best foi o facto de ser um pouco mais curto de pernas…
Deixando de lado as irracionalidades futebolísticas e homenageando quem realmente merece, Best serás sempre o melhor, mesmo que seja só no papel, e com um dicionário inglês-português ao lado!


7) Jorge Silva

Apesar de apenas ter saltado para o estrelato no final da década de 90, trata-se de um guarda-redes que já andava no mundo do futebol há muito tempo. Foi campeão pelo Porto, tendo transitado para Paranhos, onde aproveitou a saída de Pedro Espinha para agarrar a titularidade com unhas e dentes. A sua principal arma é a ausência de beleza física. A sua face assustadora, juntamente com a tremenda cabeleira, tornam-no num possuidor do temível “Efeito Medusa*” .
Muitos jogadores ficaram petrificados após se terem aventurado no um para um com este ágil guarda-redes.
Indiscutível do Salgueiros desde a época de 98/99, foi posteriormente exilado na longínqua ilha dos Açores, à espera que o seu Ulisses aparecesse…

*Medusa, para quem não sabe, era a senhora com cabelos de serpente que transformava todas as pessoas que lhe olhavam nos olhos em estátuas de pedra. Posteriormente, foi assassinada a sangue frio pelo patife do Ulisses. Este efeito tem secção própria.



6) Zivanovic

Goran Zivanovic, sólido guarda-redes e símbolo do União da Madeira, clube onde liderou com base no exemplo toda a comunidade jugoslava que equipou a amarelo em meados dos anos 90. Jogadores como Dragan, Jovo, Lepi, Simic ou mesmo Jokanovic não só evoluíram futebolisticamente, mas também do ponto de vista humano, sob a sombra do velho capitão. De cabelo castanho claro, encaracolado e furiosamente despenteado, cumpriu meia década como titular absoluto da baliza unionista.
Apesar dos 54 golos encaixados e da descida de divisão, na já longínqua época de 94/95, Goran, na altura contando 35 primaveras, foi titular absoluto e pilar mais firme de uma defesa assolada pelo drama dos defesas mansos , ou não contasse nas faixas laterais defensivas com o sempre sorridente Milton Mendes e Nelinho (comentário a este nome seria redundante).
Fica para a história como sinónimo de guarda-redes do União. Se acha que esta afirmação é um exagero, vamos a outra agradável interactividade livro-leitor: tente-se lembrar de um outro guarda-redes com semelhante impacto no clube, cidade e arquipélago, como Zivanovic. Bem me parecia.


5) Rufai

Haverá palavras para descrever um dos melhores guardiões que alguma vez passou pelo futebol luso? Claro que sim. Dizia-se que era um príncipe no seu país, e que havia abdicado do trono para se dedicar à sua grande paixão, a manicure. Acabou por não entrar no curso e optou pelo futebol. Em boa hora, dirão os adeptos do Farense, pois tratou-se de um dos melhores valores que alguma vez defenderam as redes do São Luís.
Internacional pelo seu país, Peter Rufai viveu os melhores anos da sua carreira no Algarve. Foi peça fundamental na melhor época do clube, em 94/95, em que alcançaram o quinto posto e a qualificação para a Europa, onde caíram perante o poderio do Lyon de Olmeta, Giuly e Maurice.
Após três épocas de titularidade absoluta no Farense, mudou-se para a Galiza, onde assinou pelo Deportivo La Coruña. Frente à tremenda concorrência de Songo’o e Kouba, não foi feliz. Chegou, no entanto, a jogar pela sua selecção nos mundiais de 1994, nos Estados Unidos, e 1998, em França.
Ficarão para sempre guardadas na memória dos adeptos algarvios as estiradas do príncipe africano, e a maneira como o sol era reflectido pela sua cara esburacada.


4) Ewerton
Ewerton Machado Joenisch. Um nome que, sem ponta de dúvida, provoca lágrimas a muitos sócios e simpatizantes do Marítimo, fazendo-os relembrar as solarengas tardes que passavam a olhar para o boné do seu mítico número 1.
Um patrão por natureza, este brasileiro chegou à Madeira na época de 87-88, contando nessa altura com uns já respeitáveis 30 anos de idade. Olhando para as épocas que equipou de verde rubro, ninguém diria que chegou tão tarde à Madeira. Passeando-se épocas a fio pelos relvados nacionais com o seu boné e o seu dente frontal de raíz morta, Ewerton tornou-se um dos maiores mitos de sempre do clube que serviu até aos 37 anos, e sem dúvida o seu mais emblemático guarda-redes.
Despediu-se quase em beleza do futebol português, através de uma batalha épica travada com Iordanov em pleno Estádio Nacional. Jogava-se a final da Taça, e Ewerton queria terminar a carreira com um troféu. Quem viu esse jogo ficou abismado com as fabulosas defesas do veterano guardião, rejuvenescido para um dos mais importantes jogos da carreira. Infelizmente a sua equipa acabou por baquear, perdendo por 2-0, mas nada nem isso conseguiu encobrir esse portento de exibição.


3) Vladan

Se Best está no top 10, então o homem que inexplicavelmente lhe sorrupiou a titularidade também tem que estar. Este gigante sérvio dispunha de uma aprimorada visão de jogo, do alto dos seus 1,97 metros, qual água a voar nos céus. A presa, a bola. A arma, a tremenda elasticidade e reflexos felinos.
Imponente e assustador, Vladan metia qualquer adversário que o ousasse enfrentar no um para um em estado de pânico. Chegou-se a ponderar se ele comeria um adversário, se as normas da liga o permitissem.
Adepto de ketchup como era, que não consegue imaginar Vladan sentado numa esplanada em Leça da Palmeira ao lado dos seus colegas Alfaia (o resistente timorense) e Serifo (a gazela guineense), a contemplar-se com a deliciosa dupla atacante da briosa: um Akwá no pão e um Febras no prato!
Para a memória dos incondicionais fãs do futebol espectáculo, apenas nos resta recordar as fabulosas estiradas de Vladan Stojkovic, a rechaçar a bola para canto após fabuloso remate de Kassumov, com a mesma a acabar por embater naquele belíssimo pavilhão gimnodesportivo por detrás de um dos topos do campo.


2) Baston

O Desportivo de Chaves tem vindo a criar uma reputação de equipa sólida defensivamente, comandada por um guarda-redes mãos-de-ferro. Nomes sonantes como Zé Nuno Amaro, Poleksic, Arteaga, ou mesmo Luís Vasco vestiram a camisola transmontana, mas no entanto nada mais fizeram do que tentar - em vão - perpetuar uma tradição que havia surgido na longínqua época de 94/95, data em que um desconhecido espanhol surgiu no Municipal de Chaves de malas e bagagens, para deixar na cidade minhota muito mais que isso: um legado.
Estavamos no início da época e o mister António Jesus, ele próprio um antigo guardião, denotou uma lacuna no plantel: faltava um guarda-redes de presença imponente entre os postes. Orlando não tinha nome no futebol primo-divisionário, e Silvino não conseguia produzir a imponência necessária do alto do seu metro e setenta e pouco. Os 22 golos sofridos em 11 jogos disputados acabaram, infelizmente, por dar razão ao treinador, que antes de sofrer a chicotada, ainda contrata um reforço: Baston.
Desconhecido, com pouco cabelo, bigode, assemelhava-se mais com um talhante do que com um guarda-redes. No entanto, as dúvidas em relação à sua valia cedo se dissiparam, e os cépticos largaram as pedras em direcção ao solo, tendo-se formado uma unanimidade que ficou conhecida como “la irmandad de Baston”.
Durante algumas jornadas passeou a sua graciosidade pelos relvados nacionais, até que o desastre sucedeu. Numa fria noite no Municipal de Chaves, o Chaves acabara de empatar o jogo contra o Sporting, fruto de um golo do inevitável Edinho. Tudo parecia encaminhado para a reviravolta. No entanto estava guardada uma surpresa para o fatídico minuto 59: a bola é atrasada para Baston, que é pressionado por Iordanov. Ao tentar fintar o astuto búlgaro, perde a bola, que sobra para Juskowiak fazer o 2-1. O Sporting vence, o Chaves, e principalmente o seu guardião, perdem. Baston tinha acabado de hipotecar todas as suas hipóteses de uma brilhante carreira em Portugal. Nesta terra em que é tão habitual a rápida passagem de bestial a besta, nenhum caso é mais dramático do que o deste nuestro hermano.
Para muitos caíste no esquecimento, mas certamente que ainda há adeptos para os quais aquele lance, que foi para ti como a bomba atómica para Hiroshima, não apaga as belíssimas memórias anteriores que tínhamos de ti.
Tristemente, a passagem de Baston pelo nosso futebol foi tão rápida que existem poucos ou nenhuns registos fotográficos. No entanto a interactividade desta obra não pára, e para vermos Baston podemos olhar para Best (o mais parecido) com os olhos semi-cerrados, imitando a voz de um espanhol.


1) Vital

Trata-se de uma justíssima homenagem, do ponto de vista quantidade/qualidade. Aquele que começou como uma esperança leonina, fez jus à sua estatura e acabou por não subir muito na carreira de verde e branco. Azar para Vital, sorte para os clubes que contaram com os seus serviços. O auge da sua carreira foi atingido, porventura, no Gil Vicente.
Em Barcelos ficará para sempre conhecido como o Yashine do Adelino Ribeiro Novo. Fez as delícias da torcida a ponto de, para muitos adeptos, ter passado o Galo para segundo plano como símbolo da cidade.
No papel, Jorge Maria podia ser quase anão. Em campo, um autêntico gigante. Os seus 172 centímetros eram muitas vezes assunto de gozo por parte dos adversários. No entanto, ao depararem-se cara a cara com Vital, cedo as compulsivas gargalhadas davam lugar a uma choradeira desalmada.
Deixou saudades no clube… tantas que o Gil procurou em Paulo Jorge um clone, mas no entanto nada há como o original…
Pequeno Vital, és o grande número 1!



O Melhor Do Mundo

Se há coisa que as estatísticas não fazem é mentir. Podem chamá-las de frias, incoerentes, ou mesmo fruto de uma reacção de cabeça quente, mas nunca mentirosas.
Assim sendo, e dadas as evidências estatísticas, resta-nos eleger aqui e agora o guarda-redes internacional jugoslavo Tomislav Ivkovic, que vestiu em Portugal as camisolas de Sporting, Estoril, Setúbal e Belenenses, como o melhor guarda-redes do mundo a defender penaltis do Maradona.



PRÉMIO DE MELHOR DO MUNDO A DEFENDER PENALTIS DO MARADONA:

Tomislav Ivkovic, pela Jugoslávia contra a Argentina e pelo Sporting contra o Nápoles.




A triste sina de ser Guarda-Redes: Introdução

Desde que há futebol, há guarda-redes. Claro que desde o início dos tempos foram sendo sujeitos a umas certas evoluções, como o progressivo abandonar da boina ou a introdução das luvas. Apenas um ou outro tradicionalista resistiu à inovação, não abnegando as suas origens, como é exemplo o grande guardião Ewerton.

Podemos dizer então que os guarda-redes, juntamente com os médios, os defesas e os avançados, são os dinossauros do desporto rei. No entanto, as outras posições evoluíram de maneira dramática, enquanto que o homem entre os postes se manteve quase intocável. Podemos então chamar aos guarda-redes as baratas do futebol, dada a intocabilidade dos seus cânones.

O que quero eu dizer quando afirmo que as outras posições mudaram dramaticamente, pergunta o leigo leitor. Resposta-mais-do-que-óbvia: novamente através de um exemplo, podemos ver que o que começou como um simples centro campista, vulgo médio, hoje em dia se ramificou em uma série de diferentes posições. Médio centro, médio ofensivo, médio box-to-box, trinco, médio ala, médio para fazer número (caso de Costa no Manchester-Porto, ou Mahon no Real Madrid-Sporting, ou mesmo Michael Thomas em qualquer jogo do Benfica na era Souness), etc. Até a posição de avançado, simplesmente o jogador que joga perto da baliza com o objectivo de marcar golos, hoje em dia pode ser Ponta de Lança, Extremo, avançado móvel que apoia o ponta de lança, e mesmo jogador perdido no meio do campo que mais vale estar lá à frente do que cá atrás onde pode ser perigoso (óbvia alusão a Missé-Missé).

Mas o verdadeiro drama está na zona defensiva, em que o jogador que antigamente era apelidado única e exclusivamente de defesa, hoje em dia sofre com uma traumática crise de identidade.
Vamos dar um exemplo de uma hipotética conversa entre José Leal, defesa polivalente que fez nome no Sporting, e o seu mister no Felgueiras na longínqua época de 95/96, Jorge Jesus:


JJ: Schhhh!* Ó Leal, porque choras meu rapaz?
* Efeito sonoro de Jorge Jesus a sorver a saliva, para falar mais claramente.

JL: mister, não sei quem sou!

JJ: Ah… tava mais à espera que só me pedisses uma pastilha…

JL: mister, tem que me ajudar nesta cruzada em busca da minha identidade perdida!

JJ: ok, ok. Mas vamos no teu carro!

JL: diga-me… QUEM SOU EU???

JJ: És o Zé Leal, defesa do Felgueiras, dono de um pé esquerdo temível, e possuídor de uma carcaça alta e esguia.

JL: Isso… isso é o que diz no papel! Eu quero é saber… que tipo de defesa sou???

JJ: Epá!!! Nunca enveredes por esse buraco negro do futebol actual, meu rapaz. Isto é um conselho de quem tem muita época neste cabelo grisalho.

JL: Pode-me então só dar um catálogo de posições defensivas, e eu ponho uma cruzinha nas que quero ser?

JJ: Por ti, Zé, tudo!


Mas quantas posições poderá haver, pergunta novamente o leitor? Citando apenas algumas, dado que o total (rezam as crónicas) está perto de infinito, temos o central, o central de marcação, o central descaído para a direita e para a esquerda e o central que fica no meio numa táctica de três defesas, o libero, o sweeper, o defesa lateral (direito e esquerdo), o defesa lateral subido devido à táctica de três centrais e dois laterais que fazem todo o flanco, o defesa que só joga para lesionar adversários, entre muitos outros…


Tudo isto para justificar a atribuição do prémio “barata do futebol” aos guarda-redes. Vamos agora alongar-nos um pouco mais sobre esta posição, até àquilo que eu gosto de chamar como “top 10” dos guarda-redes que jogaram em Portugal na década de 90.
O guarda-redes da nossa selecção e do Sporting, Ricardo, aquando da sua transferência para Alvalade, disse uma enigmática e já famosa frase:

“Sou o homem mais feliz da minha vida”

Isto dá-nos que pensar, logo vamos abrir aqui um exercício interactivo livro-leitor. Você vai parar por um momento para ponderar sobre esta frase. Será que também é o homem mais feliz da sua vida? Todas as probabilidades apontam para isso, dado só haver você na sua vida! A não ser que seja esquizofrénico, e aí a doutrina divide-se.
Partindo do princípio que não o é, estamos perante um acontecimento muito comum no futebol, designado por «Verdades de La Palisse».
E aqui entra nova “RT”, para ser utilizada não em campo, mas perante os órgãos de comunicação social:


RATOEIRA TÁCTICA NÚMERO 10: O “EFEITO DE LA PALISSE”

A resposta certa a qualquer pergunta de um jornalista é uma verdade de La Palisse.


Passando a uns exemplos concretos, temos autênticos mitos la palissianos, como “o jogo tem noventa minutos e pode acontecer um golo do primeiro ao último”, ou “a equipa não jogou bem nem mal, antes pelo contrário”. Há, no entanto, uma verdade que é mais verdadeira do que as restantes, que vou desde já apelidar de Rainha de La Palisse. A frase em questão é uma pequena pérola, e sozinha daria material para reflectirmos durante todo um livro, mas infelizmente não vai dar.


Rainha de La Palisse:

“se marcarmos mais golos que eles, ganhamos”


Já li os exemplos, mas agora como hei-de aplicá-los na prática, pergunta o leitor aspirante a treinador. Nada mais fácil. Escreva na mão 5 verdades de La Palisse, e depois siga a técnica da resposta cruzada e interpolada, ou seja, nunca dê respostas seguidas. Por exemplo, resposta 1 – resposta 3 – resposta 5 – resposta 2 – resposta 4, prosseguindo com o sempre aliviante “obrigado meus senhores” (com um ar superior), e saindo da sala de imediato, não dando hipóteses a novas perguntas, senão cairá no erro de responder a duas perguntas diferentes com a mesma resposta (o que exige alguma perícia e não é recomendado a treinadores maçaricos).
Tratam-se de respostas vagas, que deixam tudo em aberto. Mesmo que a resposta escolhida não encaixe bem na pergunta efectuada, o jornalista apenas ficará estupefacto e será ultrapassado por um colega de profissão ávido por lhe sacar alguma informação relevante.
Passando a um exemplo de uma conferência de imprensa após um jogo que terminou empatado (diálogo entre o mister e os repórteres):


R: Comentários à partida?

M: Foi um jogo tipicamente atípico! (la palisse número 1)

R: Está-se a queixar da arbitragem?

M: Todas as jornadas a situação repete-se, logo nem vou falar sobre isso. (la palisse número 3)

R: E em relação às inúmeras oportunidades falhadas pelos seus jogadores?

M: Eu e os meus jogadores temos como principal característica darmos sempre 110% em campo. O problema são as situações extra-futebol que não nos permitem ir mais além. (la palisse número 5)

R: Acha que o facto de dois jogadores titulares terem rescindido contrato a meio da semana criou mau ambiente no seu balneário?

M: O futebol é um jogo de 11 para 11, e estou muito feliz por poder apresentar jornada a jornada uma equipa inicial na qual deposito toda a minha confiança. (la palisse número 2)

R: Sente o seu lugar ameaçado?

M: Sabe que há certas situações que fartam no futebol, mas o amor pelo jogo supera tudo, e estou de corpo e alma no clube. (la palisse número 4). Obrigado meus senhores!


Como devem ter percebido, qualquer resposta encaixa-se aceitavelmente na maioria das questões. Para comprovar isso, podem tentar outra sequência de respostas, como por exemplo o sempre irreverente 4-1-3-5-2!
Nada mais simples, dirá o comum leitor. No entanto, o que parece simples ao estar a ler na sua poltrona poderá tornar-se num autêntico bicho-de-sete-cabeças, quando confrontado com a situação real. A pressão de ler a cábula e de aparentar um ar sério e confiante pode ser extenuante para um treinador pouco rodado. Uma situação comum é o erro de permitir a sexta pergunta. A maior parte dos treinadores congelam em vez de escolher nova resposta aleatória, pois consideram a repetição inimiga da genialidade que presumem possuir. No entanto, se fossem realmente génios, não teriam as cábulas escritas na mão.

Vamos dar um exemplo comum do mister que entrou numa transe de ignorância, ao permitir a sexta questão:


M: … obrigado meus senhores!

R: os lenços brancos, então, não o assustam?


O treinador calmo repetiria a aleatoriedade:

M: Eu e os meus jogadores temos como principal característica darmos sempre 110% em campo. O problema são as situações extra-futebol que não nos permitem ir mais além. (la palisse número 5)


No entanto, o efeito-surpresa por vezes apanha o mister menos astuto com “as calças para baixo”. Aí respostas erradas (sinónimo de não-vagas) surgem:

M: Foi sem querer, a sério. A culpa é da merda do avançado que não marca e o guarda-redes que só dá abébias.


E pronto, lá se vai uma carreira por água abaixo devido a um mísero lapso de concentração. Os jornais irão apelidar o treinador de menino da mamã, e será para sempre rotulado como um queixinhas que deita a culpa nos jogadores.
A lição a extrair deste exemplo é que, mesmo perante níveis avassaladores de pressão, nunca abandonar La Palisse! Manter a calma e as generalidades debaixo de fogo é decisivo para chegar a bom porto, qual John Rambo, no meio da guerra, que ao perder um braço diz aos colegas para não se preocuparem que é só um arranhão! Manter a calma e a confiança do grupo é fundamental, mesmo se formos péssimos treinadores. Eis a filosofia de Carlos Manuel.

Factos e Figuras: O Cubista Sérgio (Abreu)

Se o nome Sérgio, sozinho, não chama a atenção do leitor quando referente a fenómenos futebolísticos, isso não será de estranhar. Trata-se de um dos jogadores mais subvalorizados da I liga portuguesa. Defesa polivalente, mas com uma apetência especial pelo centro, passeou a sua classe e magistral sobriedade pelos relvados portugueses durante épocas a fio, com prestações de uma qualidade constantemente incoerente.

Trata-se do chamado Jogador-Obra-de-Arte. Não pelas suas inquestionáveis capacidades futebolísticas, mas sim pela sua aparência cubista, a fazer lembrar um quadro de Pablo Picasso. Aprofundando esta explicação, de modo a explicar esta teoria a um leigo, e aproveitando que temos a fotografia do jogador mesmo aqui ao lado, parece-me que ela fala por si, ao revelar as formas quadráticas da face de Sérgio.
Isto torna-se especialmente útil quando se tem pela frente um avançado com um enorme gosto pela arte. Logicamente que esse jogador, ao preparar-se para executar a revienga, vai ficar abismado com a aparência cubista do seu marcador, ficando a apreciá-la, e esquecendo-se da bola.

Fontes pouco fiáveis dizem-me que quando pendurou as chuteiras, Sérgio não se tornou treinador. Foi, sim, exposto no Louvre para exibição ao público.

As Bácoras e o Futebol

Aquilo que muitas vezes parecem bácoras futebolísticas por parte dos comentadores, não são mais do que comentários indirectos a certos futebolistas, que passam ao lado do comum adepto de futebol. Este, estupefacto por não compreender determinada afirmação, cataloga-a como bácora. Nada mais errado. Passo a dar alguns exemplos.

1) O futebol tem uma intensidade plástica fora do vulgar.

Trata-se claramente de uma alusão à cara de Nito, defesa que ganhou fama com a cruz de Cristo ao peito. Dizem as más línguas que o lateral tem uma bala alojada na face, daí a sua caricata expressão facial. Ao início, colegas e treinadores acharam que ele era apenas desconfiado, mas nem Octávio Machado conseguia estar desconfiado vinte e quatro horas por dia, e acabaram por perceber que a sua expressão normal era mesmo essa.


2) Atirou com o pé que tinha mais à mão

Caro leitor, se ainda não adivinhou esta, então sinto-me deveras envergonhado, pois significa que não ganhou o chamado pensamento-raçudo-futebolístico que este livro pretende exercitar e desenvolver na sua mente. Trata-se de uma óbvia menção a Vata, antigo melhor marcador do campeonato nacional pelo Benfica, famoso pelo golo com a mão, qual Maradona do nosso modesto campeonato, que qualificou o clube da águia para a final da Liga dos Campeões (que viria, novamente, a perder). As últimas notícias sobre o avançado relatavam um triste fim de carreira no campeonato Indonésio.


3) Um passe para a zona de ninguém, onde realmente não estava ninguém.

Trata-se de um golpe baixo por parte do comentador. Baixo porquê? Porque o visado era obviamente Rui Barros, o mais pequeno grande jogador do campeonato nacional. Com 1,59 metros, o antigo jogador da Juventus e do Mónaco era tão pequenino que muitas vezes os comentadores não o viam da zona de comentário. Outras vezes, como era o caso, Rui era apenas o objecto de escárnio e maldizer por espadaúdos comentadores que invejavam a sua cumplicidade com o esférico. Para mim, Rui sempre será um gigante à altura de outros mitos como Rosário, Fua, ou mesmo Caetano.

Factos e Figuras: A Polivalente Carreira de Carlos Costa

Quando, no fim da época 94/95, Paco Fortes foi pescar três cartas ao baralho de um Beira-mar acabado de ser relegado para a 2ª divisão, porventura nunca teria imaginado aquilo que lhe estava prestes a suceder. Muitas vezes as contratações têm sucesso, como tirar um às ou um rei. Porém, não menos vezes também saem furadas. Agora muito, muito raramente, aparece um joker.

O mais algarvio de todos os catalães escolheu o central Paulo Miguel, o playmaker Punisic e o polivalente Carlos Costa para lhe fazerem companhia no São Luís, num Farense em declínio após anos de glória que culminaram na ida do clube algarvio a Taça UEFA.

E foi precisamente nesse 3º elemento que Paco Fortes encontrou o seu joker. Porventura um dos jogadores mais subvalorizados do futebol português, Carlos Manuel nasceu em Coimbra no ano de 1966. Dono de um físico impressionante, sempre teve o condão de comandar, do alto dos seus 187 centímetros, as equipas onde alinhava. Chegou ao Beira-mar, após passagem pelo Feirense, rotulado de avançado. Cedo se confirmou como um dos jogadores mais utilizados, fazendo temíveis combinações nas zonas mais avançadas do relvado do Mário Duarte. Sobreviveu à limpeza de balneário no Mário Duarte, com a transição forçada pelo abandono daquele monstro sagrado que foi e sempre será Dino. Saíram também nomes sonantes como Kristic ou Draskovic, tendo entrado uma nova fornada, constituída por Toni – ex-FCP e companheiro de ataque de Bambo nas selecções jovens de Portugal -, o brasileiro Tarcisio e o veterano Pitico, proveniente do Farense. Carlos Costa foi o elo de ligação numa época de cisma. No entanto, os resultados tardaram a aparecer e o clube de Aveiro acabou por descer de divisão. Mas não Carlos Costa. Na transferência sensação de um quente verão que viria a ser marcado também pelo abandono de Paulo Madeira do Restelo para a Luz, ou da dispensa de Vítor Paneira para Guimarães, ou até mesmo da transferência de Quim Machado da Amadora para Chaves, o polivalente jogador mudou-se de armas e bagagens para o Algarve, onde viveu, porventura, os seus melhores e também piores anos de futebolista profissional.

Paco Fortes, a velha raposa que, após duas décadas de futebol nacional, ainda não falava português, sabia que tinha nas mãos um jogador especial. Mas 8 golos em 61 jogos na divisão principal não eram números impressionáveis para quem desejava desalojar monstros sagrados da arte de violar a virgindade das redes como Hassan Nader (78 jogos e 45 golos pelo Farense) e de abrir buracos na defensiva adversária, permitindo a entrada dos companheiros de ataque, como Djukic (108 jogos e 17 golos). No entanto, o miolo do terreno no São Luís andava órfão de um líder, com Hajry já velho e a precisar de apoio que o libertasse para missões de cariz exclusivamente ofensivo. Com problemas financeiros, o Farense viu-se obrigado a libertar peças fundamentais do seu meio campo defensivo, como Hugo, Miguel Serôdio, ou mesmo Sérgio Duarte, jogadores que após muitas épocas de clube, abandonaram o barco em busca de glórias maiores. Saiu também Hassan Nader, rumo a luz. Mas o destino a dar a Carlos Costa já estava dado, e não era na parte atacante do relvado: Punisic e Hajry formavam os vértices ofensivos de um triângulo que tinha como base Carlos Costa. Forte, bravo, líder, aquele que ficou conhecido como o Braveheart algarvio. Joker porque? Na “RT” de Paco Fortes, havia um balanço perfeito entre um ataque rápido e mortífero, e uma defesa segura e coesa. Djukic era o ponta-de-lança titular – Christian, posteriormente internacional brasileiro e jogador do PSG e do Galatasaray, sentava-se no banco de suplentes, ainda jovem e inexperiente para fazer concorrência ao gigante jugoslavo, apoiado de perto por dois brasileiros: o “maverick” Caccioli, um jogador que tinha o génio futebolístico em quantidade inversamente proporcional ao seu cabelo, e o irreverente e imprevisível Helcinho. Seguia-se o já referido triângulo do miolo do terreno, e a linha de quatro defesas era composta por Eugénio, o pequeno e veloz lateral direito, o polivalente e gadelhudo Paixao, o gigante Idalécio a dar os primeiros passos na I divisão, e o líder do quarteto, Jorge Soares. O ponto forte da “RT” de Paco era que, em missões defensivas, a equipa fechava-se a sete chaves, qual caixa forte, mas era de uma velocidade estonteante quando se desdobrava para rápidos e venenosos contra ataques. E era aqui que entrava Carlos Costa, qual Joker para a estratégia de Paco Fortes: fazia qualquer posição no terreno. Quando a equipa defendia, metia-se entre os seus centrais, funcionando como libero varredor, fazendo dobras e comandando nas marcações. Quando a equipa subia no terreno, Carlos Costa funcionava como uma “rede” para os artistas da sua equipa, precavendo qualquer perda de bola. Era o pêndulo da equipa, o líder, o timoneiro. Quando a equipa se via em desvantagem, no momento de dar o tudo por tudo, era ele que subia no terreno, encaixando-se entre os centrais adversários para o último forcing.

Mas há mais em Carlos Manuel Salgado Costa do que aparenta a primeira vista. Trata-se de um jogador com uma das mais curiosas tranjectórias do nosso futebol. Com o passar das épocas, foi recuando no terreno. Avançado em Aveiro, médio e depois defesa no Farense. Esse aumento de responsabilidades defensivas, no entanto, apenas aguçou o apetite daquele que era, e sempre foi, um jogador com grande propensão ofensiva. O seu instinto goleador foi-se desenvolvendo, a sua astúcia e oportunismo também, tendo-se mesmo tornado, já bem na casa dos 30 e a jogar como capitão e defesa central, no melhor marcador da equipa no campeonato.

Aquele que porventura será o jogador português que mais se assemelhou a Matthias Sammer, que defendia e atacava com a mesma qualidade e eficiência, acabou por descer para as divisões secundárias com o Farense, mas não terá sido, com certeza, por sua culpa, que o projecto do clube algarvio descambou. Deu um grande exemplo como comandante e, tal como Hassan, foi para o fundo com o seu navio, o seu Sporting Clube de Farense.

Arranjas aí uns trocos?

Há certos jogadores que, apesar de muitas vezes serem dos mais bem pagos do plantel, os companheiros de equipa têm uma incontrolável necessidade de lhes dar trocos. Chamo a isto o efeito-mendigo:


RATOEIRA TÁCTICA NÚMERO 8: O “EFEITO MENDIGO” Ninguém espera muito do mendigo. Quando alguém se apropria hostilmente de uma empresa, nunca está à espera que um mendigo lhe faça frente. Assim sendo, o pretenso mendigo usa essa sub-valorização com que foi conotado para contra-atacar, utilizando o “Efeito Surpresa”.



RATOEIRA TÁCTICA NÚMERO 9: O “EFEITO SURPRESA” É o inverso do “Efeito Planeado”, que não vou explicar senão nunca mais daqui saímos. Trata-se de surpreender a outra equipa, ao actuar de forma diferente do que seria de esperar. Exemplo: Pôr o Mangonga a jogar em vez do habitualmente titular Roberto Carlos, surpreendendo o adversário com um ataque mais veloz do que seria de esperar.


O “efeito mendigo” teve, desde sempre, grandes intérpretes. Contudo, a fornada dos anos 90 foi especialmente rica.
Continuando a explicar o efeito, de modo a aperfeiçoar a compreensão do mesmo por parte dos leitores, vamos usar ligações lógicas (as premissas utilizadas são óbvias generalizações, dado haverem casos especiais que em nada interessam para provar este efeito):


Mendigo é sinónimo de pobre sem habitação própria;

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Quem assim é pode-se considerar desfavorecido em relação aos demais;

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Assim sendo, parte de trás numa corrida ao sprint neste mundo cão;

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Os “outros”, bem sucedidos e prepotentes, sentem que são más pessoas se não os ajudarem, pois eles são coitadinhos e não os consideram como potenciais adversários;

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No entanto, nem tudo o que parece é. As aparências enganam. Mais uma frase feita aqui e o leitor lançar-se-ia implacavelmente contra a porta da casa de banho em busca de algo original.

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Por vezes uma pessoa aparenta ser pobre quando, afinal, não o é. As razões para isto são diversas e não vamos entrar por aí.

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Passando para o campo de futebol: muitos jogador
es parecem mendigos, o que desperta um sentimento de piedade nos adversários. Parecer mendigo não significa sê-lo, muito menos ser burro, daí o jogador em questão aproveita o desleixo adversário e zás: golo!

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E assim acontece o “efeito mendigo”… daí ser recomendado não julgar um livro pela capa. Este que está a ler neste momento é um bom exemplo, mas ao contrário: a capa é bem melhor do que o interior.



Pequenos Affairs 4: Robaina e o Futebol Português

Não sei bem o que dizer sobre Robaina. Quem era este extremo esquerdo antes de vir para o Sporting? Quem foi este extremo esquerdo depois de abandonar o Sporting? Quem foi este extremo esquerdo enquanto esteve no Sporting?
Imaginando aqui uma cena que me parece bastante provável, vejo Guiseppe Materazzi a entrar na sala de imprensa com o novo reforço, e apresenta-o: “Este é o Robaina”. Os repórteres, simpáticos, dizem: “Olá, como vai? Já agora senhor Materazzi… o reforço para o lado esquerdo?”.
Veio emprestado para Alvalade, rotulado de grande esperança espanhola. Mas se de lá só nos enviam os tomates e os vinhos que têm a mais, porque nos enviariam algo mais do que um jogador excendentário? Sim, porque certamente que Robaina, pelo que mostrou em Portugal, era um predestinado “jogador a mais”.
Sorte tiveram os Sportinguistas, dado que a dispensa de Robaina no final da época foi bem coberta com outro óptimo “figurante” para o flanco esquerdo: Alan Mahon.

Prémio Emplastro


Desde que há futebol, há jogadores carraça, daqueles que os treinadores gostam e assignam à marcação da estrela adversária. Na maioria dos casos esses jogadores nem reconheciam uma bola se ela lhes batesse na testa. São máquinas de eliminação perfeitas, mas só servem para isso mesmo. Vêm com uma etiqueta nas costas que diz: Cuidado! Não passar a bola em caso algum!. Normalmente, esses jogadores não aparecem como protagonistas nas fotografias das revistas e jornais. No entanto, desenvolvi um pequeno teorema que ainda está por provar:


Teorema do Jogador Carraça:

«O nível de carracez* dos jogadores é directamente proporcional ao número de vezes que aparece em segundo plano nas fotografias »



Passo a apresentar alguns carraças-mor:

Andrade, que ficou famoso ao serviço do Belenenses por eliminar a ameaça João Vieira Pinto em diversos jogos contra o Benfica. Transferiu-se posteriormente para o clube encarnado, onde foi usado para desempenhar igual função, mas desta vez contra os grandes astros europeus nas competições europeias. Trata-se de mais um caso de fraca polivalência, pois não era especialmente bom a qualquer posição. No entanto, fica para a posteridade como um dos mais famosos marcadores homem-a-homem da 1ª divisão nacional. Vou dispensar aqui qualquer tipo de graçola de teor homossexual, do género “Andrade, quando mete na cabeça, não larga o seu homem”, por as achar de profundo mau gosto.

Luís Vouzela, um trinco de grande garra que saltou para a fama ao serviço da União de Leiria, ganha o prémio de carraça fotogénica.
Não são poucas as vezes que aparece uma foto de um grande astro dos nossos relvados com Vouzela por detrás, a morder a língua num esforço quase desumano para se manter agarrado ao adversário, quase ao ponto de lhe chupar o sangue e provocar umas quantas infecções.

“Uma imagem vale mais que mil palavras”

Esta frase clássica serve que nem uma luva para provar aquilo que digo.
Como se consegue ver pelas duas fotos apresentadas, Luís era um trinco incansável que pura e simplesmente não desgrudava do jogador cuja marcação lhe havia sido incumbida. Estes jogadores são chocolates belgas tácticos, ou seja, têm uma perfeição e uma classe do ponto de vista funcional que os distancia dos demais.
São, por norma, deliciosamente apreciados pelos seus misters, ao ponto de muitas vezes serem rotulados de imprescindíveis.


Sérgio Conceição, não é uma carraça no sentido anteriormente explicado da palavra, mas também é muito fotogénico. Que o diga o realizador de um jogo do Inter nas competições europeias na época 2002/2003, salvo erro na fase final da Champions League contra o Milan, que deu protagonismo ao extremo português, sentado no banco, durante largos instantes. Razão? Sérgio devia ter carraça nas zonas baixas, já que não as parou de coçar durante bastante tempo, para regozijo dos milhões de espectadores que se preparavam para assistir ao derby milanês. Uma junção de Luís Vouzela e o filme Querida, encolhi os miúdos?

* nível de carracez = quanto maior, mais carraça o jogador é.

Factos e Figuras: Yekini, o Fura-Redes

Qual o contrário de guarda-redes? Não, não é fura-redes, mas faria algum sentido. O contrário é rouba-redes, mas isso agora não vem ao caso.

Rashid Yekini, avançado com o físico de um bisão* norte-americano, era um goleador nato e um dos mais fantásticos avançados que já jogaram no campeonato nacional. Era, pura e simplesmente, o pesadelo de qualquer último reduto adversário, pois qualquer remate saído das suas enormes pernas era remetido, inevitavelmente, com selo de golo.

Não era homem de rodriguinhos, muito pelo contrário. Era um jogador simplista. O jogo para ele era constituído por muito poucas acções: receber a bola, rematar a bola, arfar intensamente para cima dos defensores adversários.
Simples, mas eficaz. Internacional nigeriano (84 jogos e 26 golos), foi no Vitória de Setúbal que atingiu o pique desportivo de uma grande carreira. Proveniente do Africa Sports, em 4 épocas marcou 90 golos em 108 jogos pela equipa do Sado. Marca sem dúvida impressionante.

Apesar do interesse dos grandes, acabou por rumar à Grécia, onde alinhou pelo Olympiakos. Infelizmente, perdeu a chama. Regressaria ao clube onde floresceu para o jogo em 1996, mas já vinha sem a pujança de outrora.

* Animal de envergadura transbordante, também designado por Bisonte.

Grandes Duplas - A Origem do Romário - Ronaldo

Normalmente as grandes duplas são dois avançados ou dois defesas centrais. Nunca ouvi falar numa dupla guarda-redes & extremo direito, ou trinco & lateral esquerdo, a não ser que estejam os dois adaptados, caso de Helguera e Raul Bravo. Mas eles nem formam uma grande dupla, logo a minha teoria continua válida.

A dupla mais conhecida dos últimos tempos foi a Ro-Ro, que formavam a temível linha avançada da selecção canarinha. Mas antes disso já muitas duplas em Portugal se tinham evidenciado pela sua qualidade conjunta e habilidade de jogar quase de olhos fechados. Trata-se, inevitavelmente, de mais um caso de sinergia futebolística.


Não poderia começar por outro jogador que não Roberto Carlos. Não o cantor brasileiro, mas sim algo parecido. Também nascido em terras de Vera Cruz, este ponta de lança chegou a Portugal rotulado de um assassino de área. Mas não foram os golos que o notabilizaram. Foram sim as duplas que formou. Passando a explicar, Roberto tem as características físicas de um grande cantor romântico, ao timbre do seu homónimo, ou mesmo do ícone luso-brasileiro Roberto Leal. Aliás, o nome Roberto parece ser receita de sucesso e um belo trampolim para o estrelato.
Assim sendo, Roberto Carlos formou, primeiro no Nacional da Madeira e posteriormente no Gil Vicente, duplas românticas dignas de fazer chorar qualquer fã de Leandro e Leonardo, ou mesmo Miguel e André.
No início da década de 90 equipou de alvi-negro, e formou uma temível dupla com o internacional brasileiro Robertinho, digna de rebentar com o mais elástico dos tímpanos. Numa equipa então comandada pelo conceituado Jair Picerni, e onde militavam ícones como Paulinho (defesa internacional português), Rolão Preto ou mesmo Edmílson (que ganhou fama em Portugal ao serviço de Marítimo e Guimarães), a mais valia era sem dúvida essa fabulosa química que emergia sempre que a dupla estava em campo.
Olhando para as fotos dos dois jogadores, e imaginando-as no cartaz de umas feiras populares como a actuação em destaque, quem não iria a este concerto, e porventura compraria o álbum no dia seguinte? A dupla Roberto Carlos – Robertinho tinha tudo para ser um exlíbris da música popular brasileira.


Esta dupla, no entanto, não durou muito tempo, alegadamente devido a incompatibilidades artísticas. Outra razão poderá ter sido o afundamento do Nacional nas divisões secundárias durante grande parte da década de 90. No entanto, Roberto Carlos tinha muita arte dentro de si, e queria partilhá-la com os adeptos de futebol portugueses.
Mudou-se de malas e bagagem para Barcelos, onde encontrou outro potencial candidato a cantor romântico, nada menos nada mais que o famigerado Néné Santarém. Este era um jogador em miniatura, protótipo de rato-atómico com 1,65m de altura. Em palco, a dupla não era suficiente homogénea, dada a diferença de 14 centímetros, e a química não rolou. Invejas e conspirações pelas costas vieram a público. Outra das razões poderá ter sido o facto de Mangonga ser um concorrente à altura, com umas cordas vocais de fazer inveja a Peter Schmichael e a Michael Bolton.
O projecto musical descambou, e Roberto Carlos teve que prosseguir carreira a solo.


Recuando bastante no terreno de jogo até ao eixo da defesa, houve uma dupla que será, para sempre, relembrada como uma das caricatamente menos eficientes de todos os tempos. Isto porquê? Eram ambos jogadores de grande valor, com provas dadas no escalão principal. No entanto, não evitaram que o Paços de Ferreira descesse, juntamente com todos os móveis, à 2ª divisão. Será porque o guarda-redes Padrão já havia passado o auge da carreira? Será que os trincos da equipa, Dacroce e Bozinoski, não eram suficientemente aguerridos e deixavam passar tudo o que aparecia, qual faca quente em manteiga? Ou será que a culpa era dos laterais Mota (primeiro nome José, futuro treinador do clube) e Álvaro Gregório? As razões ficam no segredo dos deuses. A mim, compete-me apenas lançar a dúvida, não chegar a conclusões, pois o futebol não é uma ciência exacta e, como toda a gente sabe, é jogado por seres humanos, por muito peculiares que esses sejam.
A dupla de que falo era formada por «Chico» Oliveira, moçambicano de gema, jogador frio e intransponível no jogo aéreo, e por Sérgio Cruz, rotulado como dos melhores líberos do futebol nacional, e titular por todos os clubes por onde passou. Formaram durante duas épocas uma dupla de sucesso que garantia a inviolabilidade das balizas do grémio da capital do móvel.
Qual terá sido a razão para o descalabro à terceira época? Foi uma época atroz para o clube. 49 golos sofridos e 31 marcados, para acabar a dois pontos do Braga, 15º classificado. Aquela que era apontada como uma das melhores duplas, estatisticamente acabou como a quarta defesa mais batida da época. Os números são frios, concisos, por vezes excessivamente duros. Nos momentos de maior aperto os sócios só sabem apontar os dedos aos alvos fáceis, nunca relembrando as alegrias passadas que esses mesmos carrascos lhes haviam proporcionado.
O futebol, triste e infelizmente, é assim. A passagem de bestial a besta é tão rápida quanto Lucky Luke.
Nas duas épocas transactas, com a mesma dupla a titular, o Paços havia ficado em 10º, com 44 golos sofridos (92/93) e 12º, com 45 golos sofridos (91/92). Uma diferença de 4 golos apenas ditou o desmoronamento de uma das mais belas duplas defensivas de que há memória no futebol luso.

Há duplas que ficam famosas por se entenderem dentro de campo como se fossem gémeos siameses, comunicando extra-sensorialmente. Outras, por serem companheiros inseparáveis de sector durante anos a fio. E depois há aquelas duplas que ficam conhecidas devido a peculiaridades físicas.
É neste último grupo que se enquadram os patrões do miolo axadrezado na época de 97/98.
O primeiro componente da dupla jogava um pouco mais recuado, devido às suas características marcadamente defensivas. Com a carreira para sempre marcada devido à polémica Ovarense-Sporting, falamos de Luís Manuel, o trinco voluntarioso e antigo pescador.
Um pouco mais adiantado no terreno, no entanto sem descurar uma ocasional ajuda ao seu companheiro de sector nas tarefas defensivas, vislumbramos Luís Carlos. Brasileiro de técnica e raça acima da média, possuía também uma gadelha que em nada envergonhava o “padrinho” Pedro Miguel*.

*“padrinho” pois entendo que Pedro Miguel foi e será para sempre “o” jogador de grande cabeleira ao vento em Portugal. Assim sendo, ele será denominado como padrinho, e todos os outros gadelhudos, antes ou após a era PM nada mais serão do que meros afilhados.


Luís Manuel, no entanto, é também ele um repetente nestas andanças. Isto porque uns anos antes, ainda ao serviço do Salgueiros, tinha feito uma dupla capilarmente volumosa com Djoincevic.
Tratou-se, no entanto, de uma dupla “invertida”. Não falo das tendências sexuais, mas sim do conjunto barba e cabelo.
Enquanto que Luís, centro campista, se apresentava no relvado com uma tremenda cabeleira, também o defesa jugoslavo fazia tremer tudo e todos, mas com a sua espessa barba.
Estranhamente, enquanto que um era carinhosamente apelidado de Barby, era o outro que tinha cabelo e carinha de fazer inveja a uma boneca.



Testa, não se usa?

Faço aqui uma pausa para o leitor recuperar o fôlego, e aproveito para relembrar o antigo defesa central benfiquista, Ronaldo, que prosseguiu carreira na Turquia. Formou das duplas de centrais esteticamente mais caricatas do nosso futebol, juntamente com Paulo Madeira.

Dinastias Futebolísticas

Nesta secção vou falar de grandes equipas que fizeram enorme furor. Não estou a falar do fabuloso Ajax de Cruyff, nem do Benfica de Eusébio, muito menos do Milan do tridente Van Basten – Gullit – Rijkaard. Nada disso. Estas equipas toda a gente conhece, e o que eu quero é dar crédito aos sub-apreciados.
Assim sendo, vou falar do União da Madeira da colónia brasileira e jugoslava, da União de Leiria que trabalhava em part-time no comboio-fantasma, do Estrela da Amadora e a sua defensiva pré-reformada, e de um Sporting com uma noção errada de defender bem.



Aliança Brasil-Jugoslávia na Madeira

Neste mundo em que vivemos, quem tem o dom da premonição tem o único olho disponível numa terra de cegos. Isto introduz a próxima “RT”:


RATOEIRA TÁCTICA NÚMERO 7: O “EFEITO CICLOPE”

Aqueles que são abençoados pela faculdade da premonição podem e devem tirar partido do seu dom, tomando providências para o que apenas eles sabem que irá acontecer.

Os dirigentes do União da Madeira foram, sem dúvida, um evidente exemplo do “Efeito Ciclope”. Digo isto porque anteciparam dois efeitos da modernidade: a lei-Bosman e a globalização. Estes dois fenómenos juntos fizeram com que, hoje em dia, cada equipa mais estrangeiros do que jogadores nacionais.
Quem olhasse para o União da Madeira há uns anos veria o que estava para acontecer no mundo do futebol. O autêntico clã de jugoslavos e brasileiros que equiparam de amarelo e azul durante a década de 90 foram nada mais do que um presságio para o que aí vinha.
Do leste tínhamos o simbólico guarda-redes Zivanovic, que comandava aos berros os companheiros Dragan, Jokanovic, Jovo, Lepi e Simic.
Depois tínhamos os atletas de Cristo Pedro Paulo, Beto, Leonardo, Milton Mendes, Márcio Luís, Luisão, Manu, Rodrigão e Joilton.
Nesta salada de estrangeiros, resistiram Nelinho, Sérgio Lavos e o capitão Germano.
Recorrendo às estatísticas da época, podemos estimar um 11 inicial para a época de 94/95: Zivanovic; Dragan, Nelinho, Piá e Leonardo; Pedro Paulo, Jokanovic, Sérgio Lavos e Rodrigão; Lepi e Simic. Conclusão: 5 jugoslavos, 4 brasileiros e 2 portugueses.
À frente do seu tempo, a equipa acabou despromovida…



Filme de terror em Leiria

Estávamos no início da época de 94/95. O Benfica preparava-se para iniciar uma longa travessia no deserto, e a União de Leiria faria o percurso inverso, regressando ao convívio dos grandes para se afirmar como um dos valores seguros da principal divisão nacional. Sinal desta afirmação foram os resultados entre as duas equipas durante a época: vitória do Leiria em casa por uma bola a zero, golo do central que se haveria de transferir para o Sporting, Luís Miguel, e empate a uma bola na Luz, com golos de Paulo Pereira para os encarnados e um empate tardio para a União, autoria do «rato atómico» Fua.
Surpresa para muitos, nada mais que justiça para os verdadeiros sabedores do futebol em todas as suas vertentes, foi o 6º lugar alcançado pela equipa nessa época de regresso.
Como conseguiu Vítor Manuel levar uma equipa que aparentava ser uma colecção de lacunas a ficar um ponto aquém da qualificação para a Taça UEFA? Tratou-se de uma arriscadíssima aposta na chamada “táctica estética”. Passo a explicar:


Táctica Estética

O futebol é um jogo para homens de barba rija, embora quase ninguém leve essa expressão à letra. O único jogador do Leiria que o fazia era o médio argentino Gabriel Gervino. Ora os homens querem-se feios e maus. Para as equipas “menores”, convém ter quantos mais jogadores feios e maus quanto possível. O apogeu desta táctica registou-se com a União de Vítor Manuel.


Corolário da “Táctica Estética”:

A ausência de beleza estética é proporcional ao pânico provocado na equipa adversária, o que se reflecte dentro de campo e finalmente na tabela classificativa. Trocando por miúdos : Quanto mais feia a equipa, melhor!


Olhando para o plantel do clube nessa época, constatamos que a baliza do veterano Álvaro estava bem protegida por grandes intérpretes da atrás referida táctica:

Os dois centrais de serviço eram Luís Manuel e Crespo. Enquanto que o primeiro foi uma das revelações da época, Crespo era um jogador de nauseabunda envergadura física. Aliás, ambos o eram. 187 e 185 centímetros de altura eram um bom cartão de visita e um seguro de inviolabilidade para a baliza do Leiria.
Como se a dupla no eixo da defesa não bastasse, Vítor Manuel usava ainda uma dupla de trincos que em nada envergonhava os companheiros na traseira. Michael Kimmel era um deles. Tratava-se de um germânico que floresceu à beira do Lis.
O seu companheiro de sector era o argentino Gervino. O europeu, pequeno mas fisicamente seco, era um trabalhador incansável. O sul americano, por seu lado, era um jogador possante e com enorme gosto pelas subidas no terreno, não se envergonhando na altura de apresentar o seu forte pontapé aos guarda-redes adversários.
Os pontos fracos da defesa, do ponto de vista visual, eram as faixas laterais. Bilro, um clássico do clube, e Leonel, um micro-machine de jogador, ambos antigos leões, ocupavam-se das mesmas, mas não prezavam pela repugnância estética.

Nos jogos tremendamente complicados, em que a “táctica estética” tinha que ser levada ao máximo, o mister puxava dos galões e, para além dos 7 jogadores atrás citados, punha em campo mais quatro jogadores, estes de cariz ofensivo, também especialistas neste tipo de jogo.
O ponta-de-lança Nelson Bertolazzi, goleador da equipa, era municiado por um tridente de fantasistas: Fua, o rato-atómico, Pedro “cabelos ao vento” Miguel e Mário “amplitude visual de 360º” Artur.
Foi, certamente, das tácticas mais assustadoramente eficazes da história técnico-táctica do futebol nacional. Com uma equipa por quem ninguém dava nada no início da época, Vítor Manuel conseguiu um fabuloso 6º lugar, feito certamente de louvar. Isto vem apenas provar que as equipas pequenas, com peças que se encaixem a um bom tabuleiro de xadrez, podem fazer furor no campeonato nacional.



Lar de Idosos da Reboleira

Falo, evidentemente, daquela defesa do Estrela da Amadora que tinha idade para ter estado presente no Mexico’86.
A soma das idades era, no mínimo, perto de infinito. No início da época 97/98, a defesa (guarda-redes mais o quarteto) contabilizava nada menos do que 167 longos anos, o que dá uma média de 33,4 anos. Isto tudo porque o lateral direito só tinha 27 anos. Vamos imaginar duas situações que, embora hipotéticas, eram possíveis e nos teriam dado imenso jeito:

1. A tramada lesão de Rui Neves

O lateral direito, Rui Neves, lesiona-se gravemente na pré-época, e vai passar a fase de recuperação para Aveiro com o seu irmão gémeo, Jorge Neves. O Estrela tem que comprar novo defesa direito. O eleito é José Rui, possante defesa do Setúbal, que conta 33 primaveras. Ainda tentaram contratar Quim Machado, mas como só faz duas épocas por clube e já havia estado na Reboleira, ficou automaticamente fora de hipótese. A média sobe logo para 34,6!

2. Mudança táctica de Fernando Santos

Para celebrar o seu 47º aniversário em grande, o mister Santos resolve cometer uma “loucura”. Primeiro pensou em cortar a barba (mal sabia ele a rapadela que estava para vir), mas acabou por se decidir pela implementação de um sistema defensivo de três unidades.
Ora isto, para o nosso caso, é ouro sobre azul. A média dispara para 35 anos de idade, bela altura para começar a considerar uma carreira de adjunto.

Passando agora para os jogadores propriamente ditos, a lógica diz que devemos começar pela baliza. Assim sendo, passamos a apresentar o defesa esquerdo, Fonseca. Com 33 aninhos cheios de genica, começou no Benfica, passando pelo Guimarães antes de chegar à Amadora.
A dupla de centrais era formada pelo capitão Rebelo, e pelo “palito” Leal. Enquanto que o histórico líder dos tricolores já se apresentava com 37 anos de idade, o ex-sportinguista ainda estava para as curvas com 33 primaveras.
Finalmente, com 38 anos, o guardião era Ivkovic , outro antigo jogador leonino (pode-se mesmo dizer que a Amadora serviu de museu do Sporting) e internacional jugoslavo.
Eram todos, evidentemente, jogadores com imensa experiência futebolística. Juntos, os “4 Mosqueteiros de Parkinson” contabilizavam mais de 800 jogos na 1ª divisão nacional.



Três Tristes Trincos

À imagem de Berlim, também o Sporting teve o seu muro “inultrapassável”. Não, não falo do grande senhor das balizas Filip De Wilde, e a sua temível técnica do “cai-para-o-chão-com-o-braço-esticado-em-vez-de-te-atirares”, se bem que foi contemporâneo do dito muro.
Falo, sim, de uma táctica usada pelo Sporting em 97/98, uma fatídica época em que o Sporting teve quatro treinadores. Octávio Machado, Francisco Vital, Vicente Cantatore e Carlos Manuel.
Há clubes que só usam um trinco, pois têm grande propensão ofensiva. Outros clubes preferem garantir a conquista do meio campo, zona nevrálgica do terreno, utilizando dois trincos, assegurando assim maior segurança defensiva.
Inovador como sempre, o Sporting inaugurou a táctica de três trincos. De entre os quatro disponíveis, Oceano, Pedro Martins, Vidigal e Lang, o técnico deixava um de fora à vez.
Seria de esperar uma solidez defensiva fabulosa, com oito jogadores em campo com missões maioritariamente defensivas. Infelizmente, tal não aconteceu, dando razão à velha máxima “a melhor defesa é o ataque”.

Outro ponto que poderá estar relacionado com os maus resultados dessa época foi o gosto subitamente adquirido pelos jogadores leoninos pela milenar arte da agressão gratuita. Expulsões atrás de expulsões foram marcando os jogos do Sporting.
Esta violência talvez fosse um grito mudo de socorro por parte dos jogadores, pois o mister Carlos Manuel obrigava todo o balneário a cantar junto em alentejano.

Carlão era certamente um homem muito motivado nos seus últimos dias em Alvalade, pois como ele próprio dizia, há que «ganhar motivação com os assobios». (Esta curiosidade em nada tem a ver com a história táctica que eu estava a contar, mas achei que ficava bem aqui. Um quadro também não tem nada a ver com a parede, mas fica bem pendurado na mesma).

Tal como o muro de Berlim não foi grande solução, também os resultados finais não auguraram nada de bom para esta táctica: Sporting ficou em 4º lugar no campeonato, com 45 golos marcados e 33 sofridos, e foi eliminado na fase de grupo da Champions League às mãos de Leverkusen e Mónaco.