Monday, May 21, 2007

Descontos de Tempo

Vou «matar» aqui o jogo, com um pedido de desculpa a todos por tamanhas barbaridades que aqui ficaram gravadas. Não vou justificar tudo o que escrevi com álcool e drogas, nem mesmo com pura demência. Acho mesmo que não há justificação plausível para este pequeno compêndio de textos absurdos.
No entanto, queria daqui enviar um abraço ao Miguel Bruno e ao Jaime Alves, dois valores do nosso futebol que não couberam nesta obra épica. Isto serve apenas para lembrar o famoso “efeito iceberg”: só se vê os 10% que estão à superfície. Este efeito aplica-se a este livro e à relação do mesmo com o futebol nacional: apresentei aqui um número muito restrito de jogadores, que ficou ainda mais limitado pelo facto de se referir apenas aos anos 90. No entanto, muitos mais artistas pisaram os nossos relvados. A esses, peço desculpa pelo meu lapso amnésico. Aos adeptos que se regozijavam com as incursões de Darci na extrema esquerda do estádio do Restelo, peço também desculpa. Quem diz um Darci, diz e relembra com saudade tantos outros jogadores que não tiveram aqui a devida homenagem.
Para rematar, quero apenas relembrar a dupla de jogadores leste europeus que foram contratados com o intuito de dar novo sangue a um Belenenses há muito arredado dos tempos áureos: Zoran Ban, internacional croata que chegou emprestado pela Juventus, e Dariusz Adamczuk, médio internacional polaco proveniente da Udinese. Nenhum deles fez história no clube da cruz de Cristo, e a moral da história é que o melhor bife é o à casa!

Obrigado.


O FIM.



P.S.: Quero pedir desculpa aos leitores que deram por eles a vegetar, com baba a cair dum canto da boca, por não terem lido nada de inteligente neste livro. Mas sejamos sinceros… se estavam à procura de algo inteligente tinham ido ler um manual de economia, com brilhantes conclusões na linha de quantos mais chouriços tiver para vender, menor é o preço que irá cobrar por cada um. Isto não se aplica aos plantéis futebolísticos, mas meramente a bens homogéneos. Quem dera ao Benfica ter vendido os extremos esquerdos Washington Rodriguez e Leónidas (jogadores da época de Damásio) a um preço médio tendo em consideração todo o plantel. O facto de ter apenas um jogador não quer dizer que se o clube o vender irá ficar milionário. Enfim, podia continuar com hipóteses mas nunca mais sairíamos daqui.
Por fim, no início do livro apelidei a década de 90 como “mágica”. Isto porquê? Porque foi a década em que eu começei a reparar no futebol, foi a altura em que tinha idade para coleccionar as cadernetas de cromos do campeonato nacional. E guardei-as. E hoje em dia dá-me um enorme gozo abrir as mesmas, olhar para os jogadores e para os respectivos comentários ridículos genéricos, como “transferiu-se esta época para o clube. Tem potencialidades para se afirmar no campeonato português”, e pensar: “epá, lembro-me tão bem deste marreta!”. São comentários feitos para crianças de catorze anos, e seguramente que na altura ficava entusiasmadíssimo quando apelidavam o avançado Pitico de rápido e regular.
Pessoalmente, delicio-me ao recordar, nostalgicamente, alguns jogadores caricatos que passaram pelo nosso campeonato. Generalizei, talvez erradamente, este pensameto e, neste momento, é muito possível que o leitor esteja de pé a aplaudir com eterno júbilo por este livro ter, finalmente, terminado.

O VERDADEIRO FIM.

As Maiores Tristezas do Futebol

Nem só de alegrias vive o futebol. Há drama no dia-a-dia do desporto rei, tal qual a vida da qual é parte integrante.
Muita gente pode achar que as tristezas se restringem à perna do Jokanovic a apontar para o Sado enquanto que o pé apontava para o Douro. Outros dirão que triste, triste, é o cabelo do Paixão. Ainda há um ou outro que chorou quando Sérgio Cruz abandonou o futebol ou quando Mandla Zwane deixou os relvados nacionais.
Para mim a maior tristeza inerente ao futebol é a incapacidade de sobrepor gerações. Nunca ninguém saberá qual era realmente o melhor jogador do mundo, dado que não jogaram todos na mesma época, enfrentando o mesmo tipo de futebol. Nomes como Pélé, Maradona, Latapy ou mesmo Zidane ficarão para sempre rotulados de mágicos, de predestinados, mas nunca haverá uma aproximação aceitável a um consenso sobre qual seria realmente o melhor.

Passando estes deliciosos mas impossíveis confrontos para o panorama nacional, há um confronto que muitas pessoas estariam em pulgas para assistir, qual Tyson vs. Lewis, ou melhor dizendo, David vs. Golias.
Trata-se, obviamente, do choque de titãs a meio campo que nos proporcionaria um Porto de meados dos anos 90 com um Benfica mais actual. De azul e branco equipava um mago cuja dimensão não traduzia o talento futebolístico. Falo do desproporcional Rui Barros. Igualmente desproporcional no rácio tamanho/talento, mas para o extremo oposto, está o antigo trinco que equipou de águia ao peito, Fernando Aguiar.


Com um mero exercício imaginário, vislumbro o ex-monegasco, de bola dominada junto ao pé direito, a passar por debaixo das pernas do internacional canadiano e, perdoem-me o sentimentalismo, mas não consigo conter a lágrima. Seria um confronto que, se tivesse acontecido, certamente daria origem a diversas obras literárias de qualidade acima da estatura do sucessor de Platini na Vecchia Signora.

Claramente que Rui nem sempre poderia levar a melhor. Estatisticamente, mais tarde ou mais cedo Aguiar tinha de ganhar algum despique. Ou então aconteceria o acidente mais que provável: no meio do jogo rui desaparecia. Jogadores e árbitros entram numa busca incessante pelo jogador, que é finalmente encontrado colado à sola de Aguiar, que o havia pisado involuntariamente. A pata de Fernando Aguiar provavelmente será do tamanho de um kart, que é o veículo de transporte mais ajustado à dimensão de Rui Barros.

Qualquer outro confronto que eu destacasse aqui seria invariavelmente reduzido a pó perante a imponência do Barros vs. Aguiar, por isso achei melhor terminar por aqui esta secção, sem no entanto imaginar o trinco, no final da partida e depois de sofrer muitas reviengas e rodriguinhos no relvado, a engolir o fantasista em pleno túnel de acesso aos balneários, sem sequer mastigar. Chegando ao balneário da equipa, solta um valente arroto cujo odor é prontamente contestado pelo eternamente suadinho mister Camacho: “mas que pivete é este a Rui Barros, Aguiar???”. É tudo uma questão de escala.

A triste sina de ser Guarda-Redes: Top 10

Top 10 dos Guarda-Redes da década de 90:

Este top é tão oficial quanto a feira da ladra. No entanto, não quer dizer que não exista ou não seja útil, logo vamos a isso. Apreciem a contagem decrescente, do 10 até ao 1, passando por outros 8 jogadores no meio.

Para eleger estes 10 mitos das redes, usámos uma fórmula econométrica muitíssimo complicada e recorremos a uma base de dados vastíssima com estatísticas completíssimas que iam desde saídas por jogo a número de pitons na chuteira.
Acabámos por achar um rácio que eficazmente traduz a qualidade do guarda-redes e que também é de fácil compreensão para o comum adepto que não gosta de tratamento e análise de dados.


Rácio de Qualidade do Guarda-redes:

Defesas da tarde / jogos na 1ª divisão



Os “jogos na 1ª divisão” penso que se explicam sozinhos. As “defesas da tarde” é um conceito algo vago e incerto, principalmente porque depende da opinião dos comentadores e observadores da partida. Logo, qual a defesa da tarde poderá ser discutível. Aliás, muitas vezes há uma grande defesa logo ao minuto 2, mas o comentador não quer cair no potencial erro de lhe chamar defesa da tarde, pois a probabilidade de haver uma defesa melhor nos restantes 88 minutos é elevadíssima. Assim sendo, uma defesa tem maior possibilidade de ser a da tarde, quando mais adiantado estiver o jogo. No entanto, a partir do minuto 80 o comentador começa a ficar apertado de tempo para eleger a defesa da tarde, e pode-se precipitar e eleger como a melhor defesa do jogo uma estirada perfeitamente vulgar (para evitar o crime de deixar a partida terminar sem eleger a defesa da tarde).

São erros do ofício com os quais temos que viver, logo vamos proceder à apresentação do top 10:


10) Acácio

O aborígene, como era carinhosamente tratado pelas gentes de Aveiro, esteve presente no mundial de 90, em Itália, onde foi suplente de Taffarel. Símbolo do Vasco da Gama, veio acabar a carreira em Portugal, ingressando no Tirsense e depois no Beira Mar, onde ganhou maior fama.
Com 94kg, rebolava rumo à bola como poucos. Formou um tridente medonho (para os adversários, como é óbvio), com Dinis e Eliseu, a dupla de centrais da equipa de Aveiro, insuficiente para manter o clube no principal divisão nacional, apesar de ter acabado a época como treinador-jogador. A principal razão para a despromoção prendeu-se provavelmente com as atrofiadas exibições fora de portas, onde lograram apenas uma vitória e um empate.
Fica, no entanto, o registo de mais um mundialista a pisar o relvado do Mário Duarte, anos depois do perfume do futebol internacional ter pairado no ar aveirense através da irreverência egípcia de Abdel Ghany


9) Neno

Adelino Augusto ou simplesmente Neno, como era conhecido nas lides do futebol, era um guarda redes felino e de reflexos fabulosos, característica marcante nos atletas africanos.
Um magnata na arte de sair mal dos postes, compensava com uma presença imponente entre os dois mastros.
Também conhecido como o Júlio Iglésias português, este cabo verdiano de cabelo encaracolado, solto e oleoso discutiu durante épocas a fio a titularidade na baliza do Benfica com Silvino.
No final, saiu vencedor, pois nas quatro épocas em que ambos equiparam de águia ao peito, Adelino jogou 94 partidas, contra as 47 do seu amigo e rival (que no entanto vestiu a camisola do Benfica por 184 ocasiões).
Neno deixou saudades, um álbum musical, e toda a boa disposição de quem tornava imprevisível qualquer directo televisivo a partir dos balneários.


8) Best

Por vezes, deitado na minha cama, começo a pensar em todas as injustiças do mundo, e há uma que tanto tem de recorrente quanto de revoltante. Porquê? Porque será que Best sempre foi o suplente crónico por todos os clubes por onde passou na 1ª divisão?
A sua alcunha certamente que não lhe foi dada aleatoriamente. Tratou-se de um intenso e completíssimo estudo sobre guarda-redes feito por cientistas e analistas britânicos. Chegaram à conclusão que Artur Paulo da Silva era o Best, que muito justamente tomou essa deixa e elegeu novo cognome futebolístico.
Muitas pessoas não familiarizadas com a língua inglesa podem julgar que Best é simplesmente uma abreviatura de Bestial. Nada mais falso e injusto para com o jogador em questão. Best traduz-se para português como Melhor!
Assim sendo, e partindo do princípio que o treinador do Leça, mister Festas, fala inglês, vamos fazer um pequeno exercício mental de lógica futebolística.
Olhando para a folha de jogadores disponíveis, o mister tem à sua disposição um Best e um Vladan… qual deverá escolher? Um treinador racional escolheria a melhor opção. No entanto, o treinador nacional não é necessariamente racional, e muitas vezes maior é sinónimo de melhor. Ora Vladan apresentava-se aos sócios do alto do seu metro e noventa e sete. A fatalidade para Best foi o facto de ser um pouco mais curto de pernas…
Deixando de lado as irracionalidades futebolísticas e homenageando quem realmente merece, Best serás sempre o melhor, mesmo que seja só no papel, e com um dicionário inglês-português ao lado!


7) Jorge Silva

Apesar de apenas ter saltado para o estrelato no final da década de 90, trata-se de um guarda-redes que já andava no mundo do futebol há muito tempo. Foi campeão pelo Porto, tendo transitado para Paranhos, onde aproveitou a saída de Pedro Espinha para agarrar a titularidade com unhas e dentes. A sua principal arma é a ausência de beleza física. A sua face assustadora, juntamente com a tremenda cabeleira, tornam-no num possuidor do temível “Efeito Medusa*” .
Muitos jogadores ficaram petrificados após se terem aventurado no um para um com este ágil guarda-redes.
Indiscutível do Salgueiros desde a época de 98/99, foi posteriormente exilado na longínqua ilha dos Açores, à espera que o seu Ulisses aparecesse…

*Medusa, para quem não sabe, era a senhora com cabelos de serpente que transformava todas as pessoas que lhe olhavam nos olhos em estátuas de pedra. Posteriormente, foi assassinada a sangue frio pelo patife do Ulisses. Este efeito tem secção própria.



6) Zivanovic

Goran Zivanovic, sólido guarda-redes e símbolo do União da Madeira, clube onde liderou com base no exemplo toda a comunidade jugoslava que equipou a amarelo em meados dos anos 90. Jogadores como Dragan, Jovo, Lepi, Simic ou mesmo Jokanovic não só evoluíram futebolisticamente, mas também do ponto de vista humano, sob a sombra do velho capitão. De cabelo castanho claro, encaracolado e furiosamente despenteado, cumpriu meia década como titular absoluto da baliza unionista.
Apesar dos 54 golos encaixados e da descida de divisão, na já longínqua época de 94/95, Goran, na altura contando 35 primaveras, foi titular absoluto e pilar mais firme de uma defesa assolada pelo drama dos defesas mansos , ou não contasse nas faixas laterais defensivas com o sempre sorridente Milton Mendes e Nelinho (comentário a este nome seria redundante).
Fica para a história como sinónimo de guarda-redes do União. Se acha que esta afirmação é um exagero, vamos a outra agradável interactividade livro-leitor: tente-se lembrar de um outro guarda-redes com semelhante impacto no clube, cidade e arquipélago, como Zivanovic. Bem me parecia.


5) Rufai

Haverá palavras para descrever um dos melhores guardiões que alguma vez passou pelo futebol luso? Claro que sim. Dizia-se que era um príncipe no seu país, e que havia abdicado do trono para se dedicar à sua grande paixão, a manicure. Acabou por não entrar no curso e optou pelo futebol. Em boa hora, dirão os adeptos do Farense, pois tratou-se de um dos melhores valores que alguma vez defenderam as redes do São Luís.
Internacional pelo seu país, Peter Rufai viveu os melhores anos da sua carreira no Algarve. Foi peça fundamental na melhor época do clube, em 94/95, em que alcançaram o quinto posto e a qualificação para a Europa, onde caíram perante o poderio do Lyon de Olmeta, Giuly e Maurice.
Após três épocas de titularidade absoluta no Farense, mudou-se para a Galiza, onde assinou pelo Deportivo La Coruña. Frente à tremenda concorrência de Songo’o e Kouba, não foi feliz. Chegou, no entanto, a jogar pela sua selecção nos mundiais de 1994, nos Estados Unidos, e 1998, em França.
Ficarão para sempre guardadas na memória dos adeptos algarvios as estiradas do príncipe africano, e a maneira como o sol era reflectido pela sua cara esburacada.


4) Ewerton
Ewerton Machado Joenisch. Um nome que, sem ponta de dúvida, provoca lágrimas a muitos sócios e simpatizantes do Marítimo, fazendo-os relembrar as solarengas tardes que passavam a olhar para o boné do seu mítico número 1.
Um patrão por natureza, este brasileiro chegou à Madeira na época de 87-88, contando nessa altura com uns já respeitáveis 30 anos de idade. Olhando para as épocas que equipou de verde rubro, ninguém diria que chegou tão tarde à Madeira. Passeando-se épocas a fio pelos relvados nacionais com o seu boné e o seu dente frontal de raíz morta, Ewerton tornou-se um dos maiores mitos de sempre do clube que serviu até aos 37 anos, e sem dúvida o seu mais emblemático guarda-redes.
Despediu-se quase em beleza do futebol português, através de uma batalha épica travada com Iordanov em pleno Estádio Nacional. Jogava-se a final da Taça, e Ewerton queria terminar a carreira com um troféu. Quem viu esse jogo ficou abismado com as fabulosas defesas do veterano guardião, rejuvenescido para um dos mais importantes jogos da carreira. Infelizmente a sua equipa acabou por baquear, perdendo por 2-0, mas nada nem isso conseguiu encobrir esse portento de exibição.


3) Vladan

Se Best está no top 10, então o homem que inexplicavelmente lhe sorrupiou a titularidade também tem que estar. Este gigante sérvio dispunha de uma aprimorada visão de jogo, do alto dos seus 1,97 metros, qual água a voar nos céus. A presa, a bola. A arma, a tremenda elasticidade e reflexos felinos.
Imponente e assustador, Vladan metia qualquer adversário que o ousasse enfrentar no um para um em estado de pânico. Chegou-se a ponderar se ele comeria um adversário, se as normas da liga o permitissem.
Adepto de ketchup como era, que não consegue imaginar Vladan sentado numa esplanada em Leça da Palmeira ao lado dos seus colegas Alfaia (o resistente timorense) e Serifo (a gazela guineense), a contemplar-se com a deliciosa dupla atacante da briosa: um Akwá no pão e um Febras no prato!
Para a memória dos incondicionais fãs do futebol espectáculo, apenas nos resta recordar as fabulosas estiradas de Vladan Stojkovic, a rechaçar a bola para canto após fabuloso remate de Kassumov, com a mesma a acabar por embater naquele belíssimo pavilhão gimnodesportivo por detrás de um dos topos do campo.


2) Baston

O Desportivo de Chaves tem vindo a criar uma reputação de equipa sólida defensivamente, comandada por um guarda-redes mãos-de-ferro. Nomes sonantes como Zé Nuno Amaro, Poleksic, Arteaga, ou mesmo Luís Vasco vestiram a camisola transmontana, mas no entanto nada mais fizeram do que tentar - em vão - perpetuar uma tradição que havia surgido na longínqua época de 94/95, data em que um desconhecido espanhol surgiu no Municipal de Chaves de malas e bagagens, para deixar na cidade minhota muito mais que isso: um legado.
Estavamos no início da época e o mister António Jesus, ele próprio um antigo guardião, denotou uma lacuna no plantel: faltava um guarda-redes de presença imponente entre os postes. Orlando não tinha nome no futebol primo-divisionário, e Silvino não conseguia produzir a imponência necessária do alto do seu metro e setenta e pouco. Os 22 golos sofridos em 11 jogos disputados acabaram, infelizmente, por dar razão ao treinador, que antes de sofrer a chicotada, ainda contrata um reforço: Baston.
Desconhecido, com pouco cabelo, bigode, assemelhava-se mais com um talhante do que com um guarda-redes. No entanto, as dúvidas em relação à sua valia cedo se dissiparam, e os cépticos largaram as pedras em direcção ao solo, tendo-se formado uma unanimidade que ficou conhecida como “la irmandad de Baston”.
Durante algumas jornadas passeou a sua graciosidade pelos relvados nacionais, até que o desastre sucedeu. Numa fria noite no Municipal de Chaves, o Chaves acabara de empatar o jogo contra o Sporting, fruto de um golo do inevitável Edinho. Tudo parecia encaminhado para a reviravolta. No entanto estava guardada uma surpresa para o fatídico minuto 59: a bola é atrasada para Baston, que é pressionado por Iordanov. Ao tentar fintar o astuto búlgaro, perde a bola, que sobra para Juskowiak fazer o 2-1. O Sporting vence, o Chaves, e principalmente o seu guardião, perdem. Baston tinha acabado de hipotecar todas as suas hipóteses de uma brilhante carreira em Portugal. Nesta terra em que é tão habitual a rápida passagem de bestial a besta, nenhum caso é mais dramático do que o deste nuestro hermano.
Para muitos caíste no esquecimento, mas certamente que ainda há adeptos para os quais aquele lance, que foi para ti como a bomba atómica para Hiroshima, não apaga as belíssimas memórias anteriores que tínhamos de ti.
Tristemente, a passagem de Baston pelo nosso futebol foi tão rápida que existem poucos ou nenhuns registos fotográficos. No entanto a interactividade desta obra não pára, e para vermos Baston podemos olhar para Best (o mais parecido) com os olhos semi-cerrados, imitando a voz de um espanhol.


1) Vital

Trata-se de uma justíssima homenagem, do ponto de vista quantidade/qualidade. Aquele que começou como uma esperança leonina, fez jus à sua estatura e acabou por não subir muito na carreira de verde e branco. Azar para Vital, sorte para os clubes que contaram com os seus serviços. O auge da sua carreira foi atingido, porventura, no Gil Vicente.
Em Barcelos ficará para sempre conhecido como o Yashine do Adelino Ribeiro Novo. Fez as delícias da torcida a ponto de, para muitos adeptos, ter passado o Galo para segundo plano como símbolo da cidade.
No papel, Jorge Maria podia ser quase anão. Em campo, um autêntico gigante. Os seus 172 centímetros eram muitas vezes assunto de gozo por parte dos adversários. No entanto, ao depararem-se cara a cara com Vital, cedo as compulsivas gargalhadas davam lugar a uma choradeira desalmada.
Deixou saudades no clube… tantas que o Gil procurou em Paulo Jorge um clone, mas no entanto nada há como o original…
Pequeno Vital, és o grande número 1!



O Melhor Do Mundo

Se há coisa que as estatísticas não fazem é mentir. Podem chamá-las de frias, incoerentes, ou mesmo fruto de uma reacção de cabeça quente, mas nunca mentirosas.
Assim sendo, e dadas as evidências estatísticas, resta-nos eleger aqui e agora o guarda-redes internacional jugoslavo Tomislav Ivkovic, que vestiu em Portugal as camisolas de Sporting, Estoril, Setúbal e Belenenses, como o melhor guarda-redes do mundo a defender penaltis do Maradona.



PRÉMIO DE MELHOR DO MUNDO A DEFENDER PENALTIS DO MARADONA:

Tomislav Ivkovic, pela Jugoslávia contra a Argentina e pelo Sporting contra o Nápoles.




A triste sina de ser Guarda-Redes: Introdução

Desde que há futebol, há guarda-redes. Claro que desde o início dos tempos foram sendo sujeitos a umas certas evoluções, como o progressivo abandonar da boina ou a introdução das luvas. Apenas um ou outro tradicionalista resistiu à inovação, não abnegando as suas origens, como é exemplo o grande guardião Ewerton.

Podemos dizer então que os guarda-redes, juntamente com os médios, os defesas e os avançados, são os dinossauros do desporto rei. No entanto, as outras posições evoluíram de maneira dramática, enquanto que o homem entre os postes se manteve quase intocável. Podemos então chamar aos guarda-redes as baratas do futebol, dada a intocabilidade dos seus cânones.

O que quero eu dizer quando afirmo que as outras posições mudaram dramaticamente, pergunta o leigo leitor. Resposta-mais-do-que-óbvia: novamente através de um exemplo, podemos ver que o que começou como um simples centro campista, vulgo médio, hoje em dia se ramificou em uma série de diferentes posições. Médio centro, médio ofensivo, médio box-to-box, trinco, médio ala, médio para fazer número (caso de Costa no Manchester-Porto, ou Mahon no Real Madrid-Sporting, ou mesmo Michael Thomas em qualquer jogo do Benfica na era Souness), etc. Até a posição de avançado, simplesmente o jogador que joga perto da baliza com o objectivo de marcar golos, hoje em dia pode ser Ponta de Lança, Extremo, avançado móvel que apoia o ponta de lança, e mesmo jogador perdido no meio do campo que mais vale estar lá à frente do que cá atrás onde pode ser perigoso (óbvia alusão a Missé-Missé).

Mas o verdadeiro drama está na zona defensiva, em que o jogador que antigamente era apelidado única e exclusivamente de defesa, hoje em dia sofre com uma traumática crise de identidade.
Vamos dar um exemplo de uma hipotética conversa entre José Leal, defesa polivalente que fez nome no Sporting, e o seu mister no Felgueiras na longínqua época de 95/96, Jorge Jesus:


JJ: Schhhh!* Ó Leal, porque choras meu rapaz?
* Efeito sonoro de Jorge Jesus a sorver a saliva, para falar mais claramente.

JL: mister, não sei quem sou!

JJ: Ah… tava mais à espera que só me pedisses uma pastilha…

JL: mister, tem que me ajudar nesta cruzada em busca da minha identidade perdida!

JJ: ok, ok. Mas vamos no teu carro!

JL: diga-me… QUEM SOU EU???

JJ: És o Zé Leal, defesa do Felgueiras, dono de um pé esquerdo temível, e possuídor de uma carcaça alta e esguia.

JL: Isso… isso é o que diz no papel! Eu quero é saber… que tipo de defesa sou???

JJ: Epá!!! Nunca enveredes por esse buraco negro do futebol actual, meu rapaz. Isto é um conselho de quem tem muita época neste cabelo grisalho.

JL: Pode-me então só dar um catálogo de posições defensivas, e eu ponho uma cruzinha nas que quero ser?

JJ: Por ti, Zé, tudo!


Mas quantas posições poderá haver, pergunta novamente o leitor? Citando apenas algumas, dado que o total (rezam as crónicas) está perto de infinito, temos o central, o central de marcação, o central descaído para a direita e para a esquerda e o central que fica no meio numa táctica de três defesas, o libero, o sweeper, o defesa lateral (direito e esquerdo), o defesa lateral subido devido à táctica de três centrais e dois laterais que fazem todo o flanco, o defesa que só joga para lesionar adversários, entre muitos outros…


Tudo isto para justificar a atribuição do prémio “barata do futebol” aos guarda-redes. Vamos agora alongar-nos um pouco mais sobre esta posição, até àquilo que eu gosto de chamar como “top 10” dos guarda-redes que jogaram em Portugal na década de 90.
O guarda-redes da nossa selecção e do Sporting, Ricardo, aquando da sua transferência para Alvalade, disse uma enigmática e já famosa frase:

“Sou o homem mais feliz da minha vida”

Isto dá-nos que pensar, logo vamos abrir aqui um exercício interactivo livro-leitor. Você vai parar por um momento para ponderar sobre esta frase. Será que também é o homem mais feliz da sua vida? Todas as probabilidades apontam para isso, dado só haver você na sua vida! A não ser que seja esquizofrénico, e aí a doutrina divide-se.
Partindo do princípio que não o é, estamos perante um acontecimento muito comum no futebol, designado por «Verdades de La Palisse».
E aqui entra nova “RT”, para ser utilizada não em campo, mas perante os órgãos de comunicação social:


RATOEIRA TÁCTICA NÚMERO 10: O “EFEITO DE LA PALISSE”

A resposta certa a qualquer pergunta de um jornalista é uma verdade de La Palisse.


Passando a uns exemplos concretos, temos autênticos mitos la palissianos, como “o jogo tem noventa minutos e pode acontecer um golo do primeiro ao último”, ou “a equipa não jogou bem nem mal, antes pelo contrário”. Há, no entanto, uma verdade que é mais verdadeira do que as restantes, que vou desde já apelidar de Rainha de La Palisse. A frase em questão é uma pequena pérola, e sozinha daria material para reflectirmos durante todo um livro, mas infelizmente não vai dar.


Rainha de La Palisse:

“se marcarmos mais golos que eles, ganhamos”


Já li os exemplos, mas agora como hei-de aplicá-los na prática, pergunta o leitor aspirante a treinador. Nada mais fácil. Escreva na mão 5 verdades de La Palisse, e depois siga a técnica da resposta cruzada e interpolada, ou seja, nunca dê respostas seguidas. Por exemplo, resposta 1 – resposta 3 – resposta 5 – resposta 2 – resposta 4, prosseguindo com o sempre aliviante “obrigado meus senhores” (com um ar superior), e saindo da sala de imediato, não dando hipóteses a novas perguntas, senão cairá no erro de responder a duas perguntas diferentes com a mesma resposta (o que exige alguma perícia e não é recomendado a treinadores maçaricos).
Tratam-se de respostas vagas, que deixam tudo em aberto. Mesmo que a resposta escolhida não encaixe bem na pergunta efectuada, o jornalista apenas ficará estupefacto e será ultrapassado por um colega de profissão ávido por lhe sacar alguma informação relevante.
Passando a um exemplo de uma conferência de imprensa após um jogo que terminou empatado (diálogo entre o mister e os repórteres):


R: Comentários à partida?

M: Foi um jogo tipicamente atípico! (la palisse número 1)

R: Está-se a queixar da arbitragem?

M: Todas as jornadas a situação repete-se, logo nem vou falar sobre isso. (la palisse número 3)

R: E em relação às inúmeras oportunidades falhadas pelos seus jogadores?

M: Eu e os meus jogadores temos como principal característica darmos sempre 110% em campo. O problema são as situações extra-futebol que não nos permitem ir mais além. (la palisse número 5)

R: Acha que o facto de dois jogadores titulares terem rescindido contrato a meio da semana criou mau ambiente no seu balneário?

M: O futebol é um jogo de 11 para 11, e estou muito feliz por poder apresentar jornada a jornada uma equipa inicial na qual deposito toda a minha confiança. (la palisse número 2)

R: Sente o seu lugar ameaçado?

M: Sabe que há certas situações que fartam no futebol, mas o amor pelo jogo supera tudo, e estou de corpo e alma no clube. (la palisse número 4). Obrigado meus senhores!


Como devem ter percebido, qualquer resposta encaixa-se aceitavelmente na maioria das questões. Para comprovar isso, podem tentar outra sequência de respostas, como por exemplo o sempre irreverente 4-1-3-5-2!
Nada mais simples, dirá o comum leitor. No entanto, o que parece simples ao estar a ler na sua poltrona poderá tornar-se num autêntico bicho-de-sete-cabeças, quando confrontado com a situação real. A pressão de ler a cábula e de aparentar um ar sério e confiante pode ser extenuante para um treinador pouco rodado. Uma situação comum é o erro de permitir a sexta pergunta. A maior parte dos treinadores congelam em vez de escolher nova resposta aleatória, pois consideram a repetição inimiga da genialidade que presumem possuir. No entanto, se fossem realmente génios, não teriam as cábulas escritas na mão.

Vamos dar um exemplo comum do mister que entrou numa transe de ignorância, ao permitir a sexta questão:


M: … obrigado meus senhores!

R: os lenços brancos, então, não o assustam?


O treinador calmo repetiria a aleatoriedade:

M: Eu e os meus jogadores temos como principal característica darmos sempre 110% em campo. O problema são as situações extra-futebol que não nos permitem ir mais além. (la palisse número 5)


No entanto, o efeito-surpresa por vezes apanha o mister menos astuto com “as calças para baixo”. Aí respostas erradas (sinónimo de não-vagas) surgem:

M: Foi sem querer, a sério. A culpa é da merda do avançado que não marca e o guarda-redes que só dá abébias.


E pronto, lá se vai uma carreira por água abaixo devido a um mísero lapso de concentração. Os jornais irão apelidar o treinador de menino da mamã, e será para sempre rotulado como um queixinhas que deita a culpa nos jogadores.
A lição a extrair deste exemplo é que, mesmo perante níveis avassaladores de pressão, nunca abandonar La Palisse! Manter a calma e as generalidades debaixo de fogo é decisivo para chegar a bom porto, qual John Rambo, no meio da guerra, que ao perder um braço diz aos colegas para não se preocuparem que é só um arranhão! Manter a calma e a confiança do grupo é fundamental, mesmo se formos péssimos treinadores. Eis a filosofia de Carlos Manuel.

Factos e Figuras: O Cubista Sérgio (Abreu)

Se o nome Sérgio, sozinho, não chama a atenção do leitor quando referente a fenómenos futebolísticos, isso não será de estranhar. Trata-se de um dos jogadores mais subvalorizados da I liga portuguesa. Defesa polivalente, mas com uma apetência especial pelo centro, passeou a sua classe e magistral sobriedade pelos relvados portugueses durante épocas a fio, com prestações de uma qualidade constantemente incoerente.

Trata-se do chamado Jogador-Obra-de-Arte. Não pelas suas inquestionáveis capacidades futebolísticas, mas sim pela sua aparência cubista, a fazer lembrar um quadro de Pablo Picasso. Aprofundando esta explicação, de modo a explicar esta teoria a um leigo, e aproveitando que temos a fotografia do jogador mesmo aqui ao lado, parece-me que ela fala por si, ao revelar as formas quadráticas da face de Sérgio.
Isto torna-se especialmente útil quando se tem pela frente um avançado com um enorme gosto pela arte. Logicamente que esse jogador, ao preparar-se para executar a revienga, vai ficar abismado com a aparência cubista do seu marcador, ficando a apreciá-la, e esquecendo-se da bola.

Fontes pouco fiáveis dizem-me que quando pendurou as chuteiras, Sérgio não se tornou treinador. Foi, sim, exposto no Louvre para exibição ao público.